sábado, 9 de agosto de 2014

TEXTO PUBLICADO NO JORNAL NOTÍCIAS DO DIA EM 26 E 27 DE JULHO DE 2014 DE ELIANA APARECIDA DE QUADRA CORRÊA





TEXTO PUBLICADO NO JORNAL NOTÍCIAS DO DIA EM 26 E 27 DE JULHO DE 2014 DE ELIANA APARECIDA DE QUADRA CORRÊA



Causos de caminhoneiro

Como de costume (e isso acontece desde que eu sou pequena), meu pai chega de suas viagens e logo em seguida nos reunimos para ouvir seus causos da estrada.
 Conta-nos o percurso geográfico pelo qual trafegou com os mínimos detalhes como um perito em sua investigação. Relata sobre placas, curvas, vilarejos e suas culturas locais, sotaques bem marcados, influenciados pela imigração.
Curiosidades, como o uso de palavras com significados diferentes de cada lugar. Como por exemplo a palavra rapariga que no Sul do Brasil significa simplesmente o feminino de rapaz sendo sinônimos de moça, mulher nova, adolescente do sexo feminino, menina, guria. Nas regiões Norte e Nordeste, estados de Minas Gerais e Goiás pode informalmente significar meretriz, amante, mulher da vida.
Ou o uso de várias denominações para um mesmo objeto, bola de gude é uma destas palavras, uma pequena bola de vidro maciço, pedra, ou metal, normalmente escura, manchada ou colorida, de tamanho variável, usada em jogos infantis. Também é conhecido pelos nomes: quilica, bulica, peca, Berlinde, burquinha, burca, baleba, bila, biloca, bilosca, birosca, bolita, boleba, bolega, bugalho, búraca, búlica, búrica, bute, cabiçulinha, carolo, clica, firo, fubeca, guelas, nica, peca, peteca, pinica, pirosca ou (Mangalho), bolinha, piripiri, xingaua, kamikaze, ximbra e bolíndri.
 . Curiosidades gastronômicas como o cacetinho, espécie de pão de sal também conhecido como pão francês, termo usado pelos gaúchos e baianos. O bauru, um sanduíche inventado por Casimiro Pinto Neto, apelidado de Bauru em referência a sua cidade natal que contém ingredientes: pão com queijo quente, presunto, rosbife, tomate, picles, orégano e sal e é claro com variações conforme estado. O pingado, café com pouco leite ou vice-versa. O virado feito feijão, carne de porco e farinha de milho grosso conhecido como quirera ou quirela um tipo de milho quebradinho. E temos também o queijo de minas e seus famosos pães de queijo. E lugares no nordeste que o consumo da carne é racionada e cara para se comprar, coisa que para nós que moramos no Sul, churrasco não pode faltar nos domingos e festividades familiar.
Mas há também nos encontros pós viagens, os causos que repassam o sofrimento do caminhoneiro com sua profissão. Um é provocado pelo clima. O calor infernal que assola o trajeto ou o frio cortante, gélido e repentino, que requer roupas, cobertores e um café quente. Ou pior, a chuva de granizo. E a carga precisa chegar no horário marcado, como diz o ditado. “Faça chuva ou faça sol”, seja noite ou dia é preciso dirigir horas sucessivas para conseguir chegar ao destino.
Outro impasse é para carregar e descarregar. Muitas vezes o caminhoneiro leva dias parados, esperando até que estes serviços sejam realizados pela empresa que o contratam. É preciso paciência e espírito iluminado para tal tédio.
Mas desta vez, ouvi atentamente meu pai contar uma cena triste da estrada. Sua voz e expressão facial demonstravam preocupação, tristeza e angústia. Viajar para ele é como sangue pulsante, contínuo, necessário, uma paixão. Só que naquele momento tinha no olhar e no pensamento a recordação de um acidente. Este também é algo que  aflige quem diariamente está na boléia.
Formação de fila, faróis em alerta e logo a frente uma cena de horror. Três veículos envolvidos. Um caminhão, um carro e uma caminhonete. O carro estava destruído. Havia três mulheres com ferimentos leves incompatível com a destruição do carro. A caminhonete ficou no acostamento do outro lado da via, sem danos maiores com os passageiros. Até aí tudo bem. Mas quando os olhos do caminhoneiro visualizam o caminhão, eis a triste cena. Um pai, um avô de rostos ensanguentados e apavorados pediam socorro para tirar o filho/neto de caminhoneiro que com o impacto violento da batida foi jogado para fora do veículo e caiu com as pernas debaixo do tanque da carreta.
A criança amparada pelo avô, que sentado segurava sua cabeça dando-lhe água para amenizar o calor e a agonia da dor cortante e esmagadora. O menino gritava com os lábios roxos, por socorro ao pai que procurava com as mãos cavar um buraco com esperança de livrar o corpo do filho sob as ferragens.
O caminhoneiro correu até seu caminhão para pegar uma enxada que leva sempre como instrumento de apoio para horas difíceis e estradas irregulares. E sem pensar no sol escaldante, no almoço que acabara de saborear e o fato de estar em idade dos cabelos brancos a risco de um enfarte pelo esforço inesperado pôr-se a cavar com todo fervor de suas forças. Sua mente só pensava em ajudar aquela criança que nunca vira antes e que naquele momento representava a imagem de um ente querido.
Outras pessoas se solidarizaram e com pás e enxadas continuaram incessantemente a cavar um buraco para libertar as pernas do menino que entre gemidos pedia para ser salvo.

Até que chegaram ambulâncias, policiais, bombeiros...e pediram para que todos se afastassem e liberassem a pista. O caminhoneiro desolado teve que sair sem poder terminar o que começou cavar o buraco para salvá-lo. Era momento de deixar aquela cena aos cuidados dos profissionais. Mas triste seguiu com seu caminhão sem conseguir saber qual foi o desfecho. Este foi um dos acidentes por falta de prudência vistos por este caminhoneiro que já viu muita coisa e ainda vivenciará outras para contar a sua família, a cada retorno de sua viagens.




TEXTO PUBLICADO NO JORNAL NOTICIAS DO DIA EM 26 E 27 DE JULHO DE 2014 DE ELIANA APARECIDA DE QUADRA CORRÊA







Causos de caminhoneiro

Como de costume (e isso acontece desde que eu sou pequena), meu pai chega de suas viagens e logo em seguida nos reunimos para ouvir seus causos da estrada.
 Conta-nos o percurso geográfico pelo qual trafegou com os mínimos detalhes como um perito em sua investigação. Relata sobre placas, curvas, vilarejos e suas culturas locais, sotaques bem marcados, influenciados pela imigração.
Curiosidades, como o uso de palavras com significados diferentes de cada lugar. Como por exemplo a palavra rapariga que no Sul do Brasil significa simplesmente o feminino de rapaz sendo sinônimos de moça, mulher nova, adolescente do sexo feminino, menina, guria. Nas regiões Norte e Nordeste, estados de Minas Gerais e Goiás pode informalmente significar meretriz, amante, mulher da vida.
Ou o uso de várias denominações para um mesmo objeto, bola de gude é uma destas palavras, uma pequena bola de vidro maciço, pedra, ou metal, normalmente escura, manchada ou colorida, de tamanho variável, usada em jogos infantis. Também é conhecido pelos nomes: quilica, bulica, peca, Berlinde, burquinha, burca, baleba, bila, biloca, bilosca, birosca, bolita, boleba, bolega, bugalho, búraca, búlica, búrica, bute, cabiçulinha, carolo, clica, firo, fubeca, guelas, nica, peca, peteca, pinica, pirosca ou (Mangalho), bolinha, piripiri, xingaua, kamikaze, ximbra e bolíndri.
 . Curiosidades gastronômicas como o cacetinho, espécie de pão de sal também conhecido como pão francês, termo usado pelos gaúchos e baianos. O bauru, um sanduíche inventado por Casimiro Pinto Neto, apelidado de Bauru em referência a sua cidade natal que contém ingredientes: pão com queijo quente, presunto, rosbife, tomate, picles, orégano e sal e é claro com variações conforme estado. O pingado, café com pouco leite ou vice-versa. O virado feito feijão, carne de porco e farinha de milho grosso conhecido como quirera ou quirela um tipo de milho quebradinho. E temos também o queijo de minas e seus famosos pães de queijo. E lugares no nordeste que o consumo da carne é racionada e cara para se comprar, coisa que para nós que moramos no Sul, churrasco não pode faltar nos domingos e festividades familiar.
Mas há também nos encontros pós viagens, os causos que repassam o sofrimento do caminhoneiro com sua profissão. Um é provocado pelo clima. O calor infernal que assola o trajeto ou o frio cortante, gélido e repentino, que requer roupas, cobertores e um café quente. Ou pior, a chuva de granizo. E a carga precisa chegar no horário marcado, como diz o ditado. “Faça chuva ou faça sol”, seja noite ou dia é preciso dirigir horas sucessivas para conseguir chegar ao destino.
Outro impasse é para carregar e descarregar. Muitas vezes o caminhoneiro leva dias parados, esperando até que estes serviços sejam realizados pela empresa que o contratam. É preciso paciência e espírito iluminado para tal tédio.
Mas desta vez, ouvi atentamente meu pai contar uma cena triste da estrada. Sua voz e expressão facial demonstravam preocupação, tristeza e angústia. Viajar para ele é como sangue pulsante, contínuo, necessário, uma paixão. Só que naquele momento tinha no olhar e no pensamento a recordação de um acidente. Este também é algo que  aflige quem diariamente está na boléia.
Formação de fila, faróis em alerta e logo a frente uma cena de horror. Três veículos envolvidos. Um caminhão, um carro e uma caminhonete. O carro estava destruído. Havia três mulheres com ferimentos leves incompatível com a destruição do carro. A caminhonete ficou no acostamento do outro lado da via, sem danos maiores com os passageiros. Até aí tudo bem. Mas quando os olhos do caminhoneiro visualizam o caminhão, eis a triste cena. Um pai, um avô de rostos ensanguentados e apavorados pediam socorro para tirar o filho/neto de caminhoneiro que com o impacto violento da batida foi jogado para fora do veículo e caiu com as pernas debaixo do tanque da carreta.
A criança amparada pelo avô, que sentado segurava sua cabeça dando-lhe água para amenizar o calor e a agonia da dor cortante e esmagadora. O menino gritava com os lábios roxos, por socorro ao pai que procurava com as mãos cavar um buraco com esperança de livrar o corpo do filho sob as ferragens.
O caminhoneiro correu até seu caminhão para pegar uma enxada que leva sempre como instrumento de apoio para horas difíceis e estradas irregulares. E sem pensar no sol escaldante, no almoço que acabara de saborear e o fato de estar em idade dos cabelos brancos a risco de um enfarte pelo esforço inesperado pôr-se a cavar com todo fervor de suas forças. Sua mente só pensava em ajudar aquela criança que nunca vira antes e que naquele momento representava a imagem de um ente querido.
Outras pessoas se solidarizaram e com pás e enxadas continuaram incessantemente a cavar um buraco para libertar as pernas do menino que entre gemidos pedia para ser salvo.

Até que chegaram ambulâncias, policiais, bombeiros...e pediram para que todos se afastassem e liberassem a pista. O caminhoneiro desolado teve que sair sem poder terminar o que começou cavar o buraco para salvá-lo. Era momento de deixar aquela cena aos cuidados dos profissionais. Mas triste seguiu com seu caminhão sem conseguir saber qual foi o desfecho. Este foi um dos acidentes por falta de prudência vistos por este caminhoneiro que já viu muita coisa e ainda vivenciará outras para contar a sua família, a cada retorno de sua viagens.

TEXTO PUBLICADO - AO CAMINHONEIRO COM CARINHO



Teto de Eliana Aparecida de Quadra Corrêa publicado no jornal notícias do dia e na antologia da Associação Confraria das Letras.



AO CAMINHONEIRO COM CARINHO


O som do caminhão. Sonho de menino. Sem nunca ter visto tal veículo, era embalado pelo som do ronco forte do caminhão que acelerava além das serras da redondeza. Em sua imaginação de menino: ser grande, ter uma linda mulher e se aventurar pelo mundo era uma grande felicidade. Desde pequeno também queria ter uma família. Quem sabe passar o seu ofício também para os herdeiros. E o auge ter até uma filha boa de boleia.
Entre porcos, galinhas e enxada, o pequeno cresceu. A escola era para ele um trampolim para a estrada. Principalmente a matéria de geografia que lhe ensinava os nomes dos lugares, suas localidades e distâncias e a Ciências, os mistérios do ciclo da vida. A mãe até queria que ele seguisse a carreira na escola, mas a sina de caminhoneiro já estava cravada em seu peito.
Além do espírito aventureiro, a curiosidade também foi ingrediente para a formação do carreteiro, pois aprender de tudo um pouco auxiliaria para desenvolver bem o ofício escolhido.
O início da profissão não foi fácil. Entre serras perigosas, estradas de chão e cargas a lenhas e toras aprendeu as primeiras manobras com um Chevrolet Brasil 1961, quatro marcha, sincronizado chamado carinhosamente entre os caminhoneiros de Queixo Duro por ter direção mecânica.
O caminhão Ford 1964 foi o seu segundo companheiro de estrada. E com orgulho comenta: - O primeiro motor a diesel fabricado no Brasil, o motor Perkeins de cinco marchas, apelidado pelos apaixonados por viagens de Caixa Seca por não ser automatizado.
Por outras aventuras foi o nobre caminhoneiro conquistar e seu pai deixou na roça a chorar. Mas desejava desbravar o mundo e ali não era o seu lugar. E de Mercedes 11 13 e depois de 20 13 de boiadeiro foi trabalhar, carregar boi do Mato Grosso e muitas fazendas frenquentou. Há Maçarico Queixo duro, motor aspirado não era turbinado mas era coisa nova no tempo que foi fabricado.
Depois veio o Scania 101 e também o 19 24 e o Volvo N10 20 e XH e com eles muitos lugares deste Brasil ele foi conhecer, do Sul ao Norte, do Nordeste ao Sudeste e até Centro-oeste o bravo carreteiro rodou estrada a fora ao som de moda sertaneja daquelas que contam histórias tão poéticas que só no tempo da viola se compunha tal melodia. Pois a saudade era tanta, em busca do sustento que muitas vezes, meses ficava longe da família.
É assim que muitos caminhoneiros do mundo de Deus começaram seu fazer em busca de abastecer a mesa alheia. Deixando a sua família na saudade e na esperança da volta, para cumprir o seu destino com hora marcada de entrega. Quantas noites sem dormir, quantos aniversários, nascimentos, enfermidades, tristezas, alegrias dos filhos sem presenciar, quanta tristeza no olhar por estar tão longe.

Mas sabe que a recompensa lhe espera além de levar o pão de cada dia às mesas de tantas pessoas e confortos para seus lares. O maior é quando chega em casa. Vê a sua família à espera para compartilhar suas aventuras. Em torno da mesa entre causos fantásticos degusta um petisco servido pela mulher amada. E vislumbra os olhares de curiosidades dos filhos gerados e educados entre uma viagem e outra trazendo a sabedoria colhida de cada lugar por onde o caminhoneiro passou.

1ª ANTOLOGIA DA ASSOCIAÇÃO CONFRARIA DAS LETRAS


TEXTO PUBLICADO DE ELIANA APARECIDA DE QUADRA CORRÊA NO LIVRO SAGANOSSA EM 2014.

Um Lugar para Sonhar


Um dia em minha cidade, uma cidade pequena, bem pequena, (onde passei a minha infância), anunciaram:
- Hoje será aberta a primeira biblioteca de nossa cidade, venham todos conhecê-la e carterinha poder fazer e com ela desfrutar de boas leituras em seu lar.
Nossa nunca poderia imaginar, eu para casa poder levar um, dois, três livros e então saborear, cada página, cada ponto, cada vírgula, cada letra e sua história adentrar. Lembro-me até hoje da história da Narizinho do Sítio do Picapau amarelo subindo no pé de jabuticabas e comendo suas frutas. Água na minha boca e cheirinho em meu nariz, transportava-me para aquele sítio, viajava no pó de pirlimpimpim.
De repente minha mãe dizia:
- Filha larga um pouco estes livros vem a mãe ajudar. Tem louça, casa para limpar.
- Só um pouquinho! Eu dizia e a história me envolvia e a hora eu esquecia.
 Mãe de novo me chamava:
- Filha, por favor, deixa para depois.
Então eu parava a minha leitura, mas cabeça ficava lá passeando pelas páginas e figuras.
Mãe dizia:
- Preste atenção filha, onde está com a cabeça esse prato não é aí, fica no outro lado da mesa!
E eu envolta com minhas ideias, meus heróis e viagens por outras terras.
Livro para mim sempre foi meu cantinho predileto, meu apego, meu sonho, meu lar, minha vida. E muitas vezes me perguntava como uma pessoa que não vem de uma família letrada pode gostar tanto de livro a ponto de desfrutar de cada linha lida e com ela poder sonhar?
Bem, como ia dizendo a biblioteca da minha cidade continuava lá, bem pertinho da minha escola e da casa da vovó.
E a cada saída da escola um pulinho eu dava lá, primeiro na biblioteca e depois na casa da vovó.
Na biblioteca me alimentava de palavras e sabedoria e na casa da vovó da barriga, do carinho, da tradição oral e da alegria.
Como ia dizendo me alimentava das palavras e da sabedoria na biblioteca da minha cidade onde morava. Comecei minhas leituras em livros pequenos e de aventuras, que falava de fábulas, lendas e contos de fadas.
Com o tempo os livros passaram a ser maiores. Queria mais informação, não só histórias fictícias como também histórias verdadeiras e também informativas.
Foi quando passei a ler livros das áreas de história, geografia, ciências, e até culinária. Tudo para mim era motivo de aprender.
Quando eu ia à casa de meus avós que era pertinho da escola e da biblioteca, encontrava o me avô já de entrada sentado na varanda observando o movimento.
Beijos e...
- Bença nôno!
E antes de sentar...
- Bença nôna!
E lá da cozinha a nôna dizia:
- Deus te abençoe! Bichinho está roendo seu estômago quer uma bolachinha?
(Aqui é bom eu me justificar eu chamava os meus avós de nôno e nôna, coisas de tradição de família).
E então enganava o estômago com as bolachas da vovó enquanto mamãe fazia a comida para a gente almoçar.
Enquanto isso sentava com o vovô e uma prosa ia rolar. E ele viajava para o passado para me contar.
- Quando era pequenino e na escola eu ia entrar. Só que era muito difícil frequentar. Primeiro que era muito longe da casa da gente. E segundo o meu caderno era uma pedra rasa e se escrevia com outra pedra que no final da aula tinha que apagar. Como estudar, eu não lembrava o que tinha escrito e por isso acabei desistindo e na escola não fui mais.
Eu ficava pensando, como posso ajudar o meu avô a estudar? Aprender as letras e deste universo deleitar? E de vez enquanto mostrava-o as letras de seu nome e ele as olhava com ar de vontade e cuidado. E até tentava rabiscá-las como se fosse um artesão fabricando a letra com cuidado e com muita perfeição. Lembro-me bem do seu P (Pois seu nome era Pedro) que ele desenhava e dizia para não esquecer:
- Meu P é como um guarda-chuva aberto.
E então eu observava admirada pela sua vontade de fazer sua neta alegre de vê-lo escrever.
Oh! Bela saudade, do meu avô que tanto me alegrou, me aconchegou que me deu uma infância que toda criança gostaria de ter.
Vovó não ficava atrás e suas histórias também gostava de contar. Sempre digo:
- Ela parece a “Scherazarda” das Mil e uma noites, pois suas histórias continuam em outras histórias as quais eu ficava vidrada ouvindo-as sem cansar.
E ela contava suas histórias, histórias de antigamente, dos tempos dos bugres que pegava crianças que desobedecia a sua mãe e saia de perto de casa para brincar na floresta.
- Nana! Ela dizia.
- Naquele tempo a gente morava em uma casinha bem longe de tudo, o tapete era umas folhas de árvore, a mesa e banco era feito também com árvores do local. Cama era de mola e acoberta era feita de pena de galinha. E as roupas eu mesma que fazia.
Nisso ela já emendava:
- Eu costurava pra fora sempre de noite, porque de dia trabalhava na roça. Usava luz de lamparina...
O apito soava na cidade era meio dia.
E vovô dizia:
- Meu dia, panela no fogo, barriga vazia! Vamo comê?
Eu não resistia almoçava na casa da vovó, sua comida sempre foi uma delícia. Pensa em comida caseira, do sítio, arroz branco, galinha ensopada. Legume cozido e muita salada, hum... só experimentando para saber. É manjar dos deuses...
Bem, o problema é que mamãe também fazia o almoço e aí se não almoçasse e então pra casa eu ia correndo para que seu almoço me alimentasse.
- De novo na casa da vovó, olha a bolacha antes do almoço! Mamãe dizia.
Mal terminava o almoço, os livros me convidavam.
- Vamos viajar!
E então lá eu ia, para a porta me sentar e os livros começava a saborear.
Um dia fui convidada para ir brincar na casa de uma coleguinha. Vocês não vão acreditar! O que eu encontrei lá.
Um tesouro, coisa rara. E esta imagem ficou gravada em minha memória que eu vou contar.
Uma coleção de livros de contos de fadas e na capa as imagens se modificavam conforme mexia o livro a criançada. E ainda por cima os livros não eram emprestados. Eram dela, ela tinha ganhado de presente de aniversário.
Isso me impressionou, pois ter livros em casa para sempre, para ser meus, ter meus, cuidados e serem lidos quantas vezes eu quisessem seria tudo para uma criança leitora como eu.
O problema era como ter livros em casa, teria que comprar! E eu vivia em uma época que presente era boneca.
Não que eu não gostasse delas. Mas livro para minha família não era brinquedo e sim coisa séria da escola. Por isso o tempo foi passando e eu ficando só na vontade de ter livro de verdade.
E eu ia brincando de fazer de conta, como não tinha o livro sempre comigo inventava histórias de momento.
Meu irmão é que desfrutava das histórias que eu inventava, o problema era quando e quase sempre ele pedia:
- Conta de novo!
E se eu não contasse igualzinho, ele dizia:
- Mana, não é assim, conta direito.
E ele todo dia antes de dormir pedia:
- Mana, conta uma história. E lá eu ia inventando mais uma história de momento.
Quando sai da minha cidade já estava adolescente. Fui para a cidade grande pois papai sonhava em tirar a sorte grande.
Queria ganhar dinheiro e uma vida melhor poder nos dar. E quem sabe a sementinha do estudo aos filhos poder plantar.
Papai sempre deu duro, viajou quase o Brasil todo atrás do nosso sustento. E quando Chegava era como um ritual. Ele sentava na sua cadeira predileta e histórias da estrada começava a nos contar.
- Estava andando pela estrada perto de São Paulo... Minas Gerais... Mato Grosso...
E assim ia contando tim-tim por tim-tim. E sempre enfatizando as cidades, estados que ia passando e por isso a geografia sempre foi o seu grande apreço.
- Se eu fosse estudá ia estudá a geografia.
Papai parou de estudar porque primeiro era a escola era muito longe de casa e segundo porque ele queria viajar o sonho de ser caminhoneiro chamava mais alto em seu peito derradeiro.
Mamãe aprendeu desde cedo, desde quando se casou, que mulher de camioneiro vive sempre na espera.
Mamãe sempre cuidou da gente com muito esmero e carinho e do seu jeito sempre incentivava a sermos bons filhos, pessoas de caráter.
Bem, vindo para a cidade grande logo eu quis saber onde fica a biblioteca desta cidade para eu poder ler e reler as histórias?
Foi quando eu conheci, a Biblioteca Municipal Prefeito Rolf Colin e era muito maior a biblioteca da cidade de onde vim. Tinha muito mais livros, os quis eu não conhecia.
E então, resolvi que começar minhas leituras nesta biblioteca eu iria sim. E no setor de Literatura foi o meu maior condutor. Estava naquela fase que livro de “romance” era a palavra-chave e quanto maior e mais páginas tinha este é que era bom de verdade.
O setor de pesquisa também foi um lugar muito frequentado por mim. A cada pesquisa solicitada pela escola, era no setor de pesquisa que eu passava horas a pesquisar.
Vocês não vão acreditar e aos professores me desculpar, eu “gazeava” aula da escola para a biblioteca visitar e poder ter o gostinho de uma obra apreciar. E eu sempre fui daquela leitora que demorava um tempão para escolher o iria ler. Pois para mim, isso era que fascinava, pois, quanto mais eu demorava, mais vontade de conhecer os livros eu acabava tendo.
Um dia visitando a biblioteca com uma amiga muito triste nós ficamos. Vimos o setor infantil abandonado, revirado, sem ninguém para cuidá-lo.
- Que pena! Pensamos.
- Um lugar como este sem ninguém para cuidá-lo, para que as crianças possam desfrutá-lo.
E ficou aquela vontade de deste cantinho poder um dia cuidar. E dar a oportunidade a muitas crianças poder admirar, sonhar, viajar e sentir o que eu senti quando criança a uma biblioteca entrei.
E olha como o mundo dá voltas.
E quando alguém quer muito e acredita que pode, que sonho pode se tornar realidade. Hoje estou aqui neste cantinho do setor infantil. Cuidando com muito carinho dando oportunidade as crianças de desfrutar das histórias do mundo do faz de contas.
Biblioteca lugar mágico que eu sempre terei em meu coração boas lembranças, eterna gratidão.