sábado, 9 de agosto de 2014

TEXTO PUBLICADO NO JORNAL NOTÍCIAS DO DIA EM 26 E 27 DE JULHO DE 2014 DE ELIANA APARECIDA DE QUADRA CORRÊA





TEXTO PUBLICADO NO JORNAL NOTÍCIAS DO DIA EM 26 E 27 DE JULHO DE 2014 DE ELIANA APARECIDA DE QUADRA CORRÊA



Causos de caminhoneiro

Como de costume (e isso acontece desde que eu sou pequena), meu pai chega de suas viagens e logo em seguida nos reunimos para ouvir seus causos da estrada.
 Conta-nos o percurso geográfico pelo qual trafegou com os mínimos detalhes como um perito em sua investigação. Relata sobre placas, curvas, vilarejos e suas culturas locais, sotaques bem marcados, influenciados pela imigração.
Curiosidades, como o uso de palavras com significados diferentes de cada lugar. Como por exemplo a palavra rapariga que no Sul do Brasil significa simplesmente o feminino de rapaz sendo sinônimos de moça, mulher nova, adolescente do sexo feminino, menina, guria. Nas regiões Norte e Nordeste, estados de Minas Gerais e Goiás pode informalmente significar meretriz, amante, mulher da vida.
Ou o uso de várias denominações para um mesmo objeto, bola de gude é uma destas palavras, uma pequena bola de vidro maciço, pedra, ou metal, normalmente escura, manchada ou colorida, de tamanho variável, usada em jogos infantis. Também é conhecido pelos nomes: quilica, bulica, peca, Berlinde, burquinha, burca, baleba, bila, biloca, bilosca, birosca, bolita, boleba, bolega, bugalho, búraca, búlica, búrica, bute, cabiçulinha, carolo, clica, firo, fubeca, guelas, nica, peca, peteca, pinica, pirosca ou (Mangalho), bolinha, piripiri, xingaua, kamikaze, ximbra e bolíndri.
 . Curiosidades gastronômicas como o cacetinho, espécie de pão de sal também conhecido como pão francês, termo usado pelos gaúchos e baianos. O bauru, um sanduíche inventado por Casimiro Pinto Neto, apelidado de Bauru em referência a sua cidade natal que contém ingredientes: pão com queijo quente, presunto, rosbife, tomate, picles, orégano e sal e é claro com variações conforme estado. O pingado, café com pouco leite ou vice-versa. O virado feito feijão, carne de porco e farinha de milho grosso conhecido como quirera ou quirela um tipo de milho quebradinho. E temos também o queijo de minas e seus famosos pães de queijo. E lugares no nordeste que o consumo da carne é racionada e cara para se comprar, coisa que para nós que moramos no Sul, churrasco não pode faltar nos domingos e festividades familiar.
Mas há também nos encontros pós viagens, os causos que repassam o sofrimento do caminhoneiro com sua profissão. Um é provocado pelo clima. O calor infernal que assola o trajeto ou o frio cortante, gélido e repentino, que requer roupas, cobertores e um café quente. Ou pior, a chuva de granizo. E a carga precisa chegar no horário marcado, como diz o ditado. “Faça chuva ou faça sol”, seja noite ou dia é preciso dirigir horas sucessivas para conseguir chegar ao destino.
Outro impasse é para carregar e descarregar. Muitas vezes o caminhoneiro leva dias parados, esperando até que estes serviços sejam realizados pela empresa que o contratam. É preciso paciência e espírito iluminado para tal tédio.
Mas desta vez, ouvi atentamente meu pai contar uma cena triste da estrada. Sua voz e expressão facial demonstravam preocupação, tristeza e angústia. Viajar para ele é como sangue pulsante, contínuo, necessário, uma paixão. Só que naquele momento tinha no olhar e no pensamento a recordação de um acidente. Este também é algo que  aflige quem diariamente está na boléia.
Formação de fila, faróis em alerta e logo a frente uma cena de horror. Três veículos envolvidos. Um caminhão, um carro e uma caminhonete. O carro estava destruído. Havia três mulheres com ferimentos leves incompatível com a destruição do carro. A caminhonete ficou no acostamento do outro lado da via, sem danos maiores com os passageiros. Até aí tudo bem. Mas quando os olhos do caminhoneiro visualizam o caminhão, eis a triste cena. Um pai, um avô de rostos ensanguentados e apavorados pediam socorro para tirar o filho/neto de caminhoneiro que com o impacto violento da batida foi jogado para fora do veículo e caiu com as pernas debaixo do tanque da carreta.
A criança amparada pelo avô, que sentado segurava sua cabeça dando-lhe água para amenizar o calor e a agonia da dor cortante e esmagadora. O menino gritava com os lábios roxos, por socorro ao pai que procurava com as mãos cavar um buraco com esperança de livrar o corpo do filho sob as ferragens.
O caminhoneiro correu até seu caminhão para pegar uma enxada que leva sempre como instrumento de apoio para horas difíceis e estradas irregulares. E sem pensar no sol escaldante, no almoço que acabara de saborear e o fato de estar em idade dos cabelos brancos a risco de um enfarte pelo esforço inesperado pôr-se a cavar com todo fervor de suas forças. Sua mente só pensava em ajudar aquela criança que nunca vira antes e que naquele momento representava a imagem de um ente querido.
Outras pessoas se solidarizaram e com pás e enxadas continuaram incessantemente a cavar um buraco para libertar as pernas do menino que entre gemidos pedia para ser salvo.

Até que chegaram ambulâncias, policiais, bombeiros...e pediram para que todos se afastassem e liberassem a pista. O caminhoneiro desolado teve que sair sem poder terminar o que começou cavar o buraco para salvá-lo. Era momento de deixar aquela cena aos cuidados dos profissionais. Mas triste seguiu com seu caminhão sem conseguir saber qual foi o desfecho. Este foi um dos acidentes por falta de prudência vistos por este caminhoneiro que já viu muita coisa e ainda vivenciará outras para contar a sua família, a cada retorno de sua viagens.




TEXTO PUBLICADO NO JORNAL NOTICIAS DO DIA EM 26 E 27 DE JULHO DE 2014 DE ELIANA APARECIDA DE QUADRA CORRÊA







Causos de caminhoneiro

Como de costume (e isso acontece desde que eu sou pequena), meu pai chega de suas viagens e logo em seguida nos reunimos para ouvir seus causos da estrada.
 Conta-nos o percurso geográfico pelo qual trafegou com os mínimos detalhes como um perito em sua investigação. Relata sobre placas, curvas, vilarejos e suas culturas locais, sotaques bem marcados, influenciados pela imigração.
Curiosidades, como o uso de palavras com significados diferentes de cada lugar. Como por exemplo a palavra rapariga que no Sul do Brasil significa simplesmente o feminino de rapaz sendo sinônimos de moça, mulher nova, adolescente do sexo feminino, menina, guria. Nas regiões Norte e Nordeste, estados de Minas Gerais e Goiás pode informalmente significar meretriz, amante, mulher da vida.
Ou o uso de várias denominações para um mesmo objeto, bola de gude é uma destas palavras, uma pequena bola de vidro maciço, pedra, ou metal, normalmente escura, manchada ou colorida, de tamanho variável, usada em jogos infantis. Também é conhecido pelos nomes: quilica, bulica, peca, Berlinde, burquinha, burca, baleba, bila, biloca, bilosca, birosca, bolita, boleba, bolega, bugalho, búraca, búlica, búrica, bute, cabiçulinha, carolo, clica, firo, fubeca, guelas, nica, peca, peteca, pinica, pirosca ou (Mangalho), bolinha, piripiri, xingaua, kamikaze, ximbra e bolíndri.
 . Curiosidades gastronômicas como o cacetinho, espécie de pão de sal também conhecido como pão francês, termo usado pelos gaúchos e baianos. O bauru, um sanduíche inventado por Casimiro Pinto Neto, apelidado de Bauru em referência a sua cidade natal que contém ingredientes: pão com queijo quente, presunto, rosbife, tomate, picles, orégano e sal e é claro com variações conforme estado. O pingado, café com pouco leite ou vice-versa. O virado feito feijão, carne de porco e farinha de milho grosso conhecido como quirera ou quirela um tipo de milho quebradinho. E temos também o queijo de minas e seus famosos pães de queijo. E lugares no nordeste que o consumo da carne é racionada e cara para se comprar, coisa que para nós que moramos no Sul, churrasco não pode faltar nos domingos e festividades familiar.
Mas há também nos encontros pós viagens, os causos que repassam o sofrimento do caminhoneiro com sua profissão. Um é provocado pelo clima. O calor infernal que assola o trajeto ou o frio cortante, gélido e repentino, que requer roupas, cobertores e um café quente. Ou pior, a chuva de granizo. E a carga precisa chegar no horário marcado, como diz o ditado. “Faça chuva ou faça sol”, seja noite ou dia é preciso dirigir horas sucessivas para conseguir chegar ao destino.
Outro impasse é para carregar e descarregar. Muitas vezes o caminhoneiro leva dias parados, esperando até que estes serviços sejam realizados pela empresa que o contratam. É preciso paciência e espírito iluminado para tal tédio.
Mas desta vez, ouvi atentamente meu pai contar uma cena triste da estrada. Sua voz e expressão facial demonstravam preocupação, tristeza e angústia. Viajar para ele é como sangue pulsante, contínuo, necessário, uma paixão. Só que naquele momento tinha no olhar e no pensamento a recordação de um acidente. Este também é algo que  aflige quem diariamente está na boléia.
Formação de fila, faróis em alerta e logo a frente uma cena de horror. Três veículos envolvidos. Um caminhão, um carro e uma caminhonete. O carro estava destruído. Havia três mulheres com ferimentos leves incompatível com a destruição do carro. A caminhonete ficou no acostamento do outro lado da via, sem danos maiores com os passageiros. Até aí tudo bem. Mas quando os olhos do caminhoneiro visualizam o caminhão, eis a triste cena. Um pai, um avô de rostos ensanguentados e apavorados pediam socorro para tirar o filho/neto de caminhoneiro que com o impacto violento da batida foi jogado para fora do veículo e caiu com as pernas debaixo do tanque da carreta.
A criança amparada pelo avô, que sentado segurava sua cabeça dando-lhe água para amenizar o calor e a agonia da dor cortante e esmagadora. O menino gritava com os lábios roxos, por socorro ao pai que procurava com as mãos cavar um buraco com esperança de livrar o corpo do filho sob as ferragens.
O caminhoneiro correu até seu caminhão para pegar uma enxada que leva sempre como instrumento de apoio para horas difíceis e estradas irregulares. E sem pensar no sol escaldante, no almoço que acabara de saborear e o fato de estar em idade dos cabelos brancos a risco de um enfarte pelo esforço inesperado pôr-se a cavar com todo fervor de suas forças. Sua mente só pensava em ajudar aquela criança que nunca vira antes e que naquele momento representava a imagem de um ente querido.
Outras pessoas se solidarizaram e com pás e enxadas continuaram incessantemente a cavar um buraco para libertar as pernas do menino que entre gemidos pedia para ser salvo.

Até que chegaram ambulâncias, policiais, bombeiros...e pediram para que todos se afastassem e liberassem a pista. O caminhoneiro desolado teve que sair sem poder terminar o que começou cavar o buraco para salvá-lo. Era momento de deixar aquela cena aos cuidados dos profissionais. Mas triste seguiu com seu caminhão sem conseguir saber qual foi o desfecho. Este foi um dos acidentes por falta de prudência vistos por este caminhoneiro que já viu muita coisa e ainda vivenciará outras para contar a sua família, a cada retorno de sua viagens.

TEXTO PUBLICADO - AO CAMINHONEIRO COM CARINHO



Teto de Eliana Aparecida de Quadra Corrêa publicado no jornal notícias do dia e na antologia da Associação Confraria das Letras.



AO CAMINHONEIRO COM CARINHO


O som do caminhão. Sonho de menino. Sem nunca ter visto tal veículo, era embalado pelo som do ronco forte do caminhão que acelerava além das serras da redondeza. Em sua imaginação de menino: ser grande, ter uma linda mulher e se aventurar pelo mundo era uma grande felicidade. Desde pequeno também queria ter uma família. Quem sabe passar o seu ofício também para os herdeiros. E o auge ter até uma filha boa de boleia.
Entre porcos, galinhas e enxada, o pequeno cresceu. A escola era para ele um trampolim para a estrada. Principalmente a matéria de geografia que lhe ensinava os nomes dos lugares, suas localidades e distâncias e a Ciências, os mistérios do ciclo da vida. A mãe até queria que ele seguisse a carreira na escola, mas a sina de caminhoneiro já estava cravada em seu peito.
Além do espírito aventureiro, a curiosidade também foi ingrediente para a formação do carreteiro, pois aprender de tudo um pouco auxiliaria para desenvolver bem o ofício escolhido.
O início da profissão não foi fácil. Entre serras perigosas, estradas de chão e cargas a lenhas e toras aprendeu as primeiras manobras com um Chevrolet Brasil 1961, quatro marcha, sincronizado chamado carinhosamente entre os caminhoneiros de Queixo Duro por ter direção mecânica.
O caminhão Ford 1964 foi o seu segundo companheiro de estrada. E com orgulho comenta: - O primeiro motor a diesel fabricado no Brasil, o motor Perkeins de cinco marchas, apelidado pelos apaixonados por viagens de Caixa Seca por não ser automatizado.
Por outras aventuras foi o nobre caminhoneiro conquistar e seu pai deixou na roça a chorar. Mas desejava desbravar o mundo e ali não era o seu lugar. E de Mercedes 11 13 e depois de 20 13 de boiadeiro foi trabalhar, carregar boi do Mato Grosso e muitas fazendas frenquentou. Há Maçarico Queixo duro, motor aspirado não era turbinado mas era coisa nova no tempo que foi fabricado.
Depois veio o Scania 101 e também o 19 24 e o Volvo N10 20 e XH e com eles muitos lugares deste Brasil ele foi conhecer, do Sul ao Norte, do Nordeste ao Sudeste e até Centro-oeste o bravo carreteiro rodou estrada a fora ao som de moda sertaneja daquelas que contam histórias tão poéticas que só no tempo da viola se compunha tal melodia. Pois a saudade era tanta, em busca do sustento que muitas vezes, meses ficava longe da família.
É assim que muitos caminhoneiros do mundo de Deus começaram seu fazer em busca de abastecer a mesa alheia. Deixando a sua família na saudade e na esperança da volta, para cumprir o seu destino com hora marcada de entrega. Quantas noites sem dormir, quantos aniversários, nascimentos, enfermidades, tristezas, alegrias dos filhos sem presenciar, quanta tristeza no olhar por estar tão longe.

Mas sabe que a recompensa lhe espera além de levar o pão de cada dia às mesas de tantas pessoas e confortos para seus lares. O maior é quando chega em casa. Vê a sua família à espera para compartilhar suas aventuras. Em torno da mesa entre causos fantásticos degusta um petisco servido pela mulher amada. E vislumbra os olhares de curiosidades dos filhos gerados e educados entre uma viagem e outra trazendo a sabedoria colhida de cada lugar por onde o caminhoneiro passou.